Editorial Jornal Cruzeiro do Sul
07/12/2009
Se depender da vontade dos vereadores - e também de uma parte expressiva dos sorocabanos, ao que indica a mobilização popular em torno do tema -, o grito de Seguuuuura, peão!, marca registrada dos locutores de rodeios, não deverá mais ser ouvido em Sorocaba. A Câmara aprovou em segunda discussão, na semana passada, projeto de lei do vereador Irineu Toledo (PRB), pelo qual ficam proibidas provas de montaria e outras competições que exijam esforço excessivo dos animais. O projeto depende agora da sanção do prefeito Vitor Lippi (PSDB) para que seja convertido em lei e possa banir, definitivamente, qualquer possibilidade de maus tratos a animais em festas e competições.
É uma ruptura corajosa, a que está em curso em Sorocaba. Exige dos homens públicos integridade e, sobretudo, têmpera para defender sua posição. E não apenas em relação a uma tradição cultural - que mescla elementos de antigos costumes rurais brasileiros com provas importadas dos Estados Unidos -, mas também em relação ao dinheiro que os rodeios costumam movimentar. Com cerca de dois mil eventos anuais em todo o Brasil, as festas de peão de boiadeiro são hoje uma indústria vigorosa, que estaria girando em torno de R$ 10 bilhões anuais. Seus defensores argumentam que, além de satisfazer um público numeroso, os rodeios geram milhares de empregos diretos e indiretos, impulsionam o turismo e proporcionam arrecadação para os municípios.
O discurso favorável, entretanto - mesmo sendo defendido por uma parcela significativa da população, que se identifica culturalmente com tudo o que se relaciona a peões e caubóis -, vem sendo combatido e, em alguns casos, como ocorre em Sorocaba, vencido por movimentos de defesa dos animais, que classificam como tortura a utilização de cavalos, touros e novilhos em provas de laço e montaria. Um vídeo com imagens captadas em rodeios, exibido na Câmara durante a votação do projeto, mostrou que os argumentos de que os animais nada sofrem e até são bem tratados são, para usar um eufemismo, generosos demais.
O projeto de Irineu Toledo antecipou a iniciativa do movimento Sorocaba sem Rodeio, que pretendia colher vinte mil assinaturas para propor ao Legislativo local um projeto de lei de iniciativa popular. Um dos coordenadores do movimento é o ex-vereador Gabriel Bitencourt, que marcou sua passagem pela Câmara com uma lei que proíbe a utilização de animais em circos. A proposta de Toledo chegou a ser criticada no início, por tomar a frente de uma mobilização popular que já vinha buscando o mesmo objetivo. Mas a importância da causa e a possibilidade de abolir os rodeios de uma vez por todas uniu as partes. O projeto do vereador acabou incorporando o texto da proposta popular, e, independentemente da paternidade, sua aprovação foi comemorada como uma vitória de todos.
Em que pesem os argumentos a favor, as provas violentas com animais não farão falta aos sorocabanos, assim como espetáculos circenses com leões, ursos e elefantes nunca fizeram. Haverá queixas no começo, mas o ganho em civilidade compensará qualquer prejuízo. Os investimentos que se destinavam às festas logo serão direcionados para outros tipos de espetáculos; o público seguirá tendo opções de lazer e os empregos continuarão sendo gerados, só que em outras frentes. E, embora ainda haja muito o que progredir, individual e coletivamente, para que os animais deixem de ser tratados de forma sádica e irresponsável, não há dúvida de que a comunidade terá dado um passo importante e de forte conteúdo simbólico, em direção a uma cultura menos impregnada de brutalidade.
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